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Messaggi Don Orione
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Nella foto: Dom Luis Orione em Mar de Espanha no 1921.
Autore: Pe. Antônio Aparecido da Silva
Pubblicato in: LANZA ANTONIO - DA SILVA ANTONIO APARECIDO, «Per le vocazioni dei figli d’Africa in Brasile», Messaggi di Don Orione 33(2001), n. 103/1, 29-48.

Quando Dom Orione chegou ao Brasil no início da década de 20, padres e freiras negros/as era coisa rara, em todo o Brasil podia-se contar com os dedos das mãos; ele abriu as portas da vida religiosa aos negros.

AS VOCAÇÕES AFRODESCENDENTES NO BRASIL

Pe. Antônio Aparecido da Silva

 

A Igreja católica conta hoje com 16 mil sacerdotes espalhados nas 250 dioceses que cobrem o vasto território brasileiro. Para que se estabeleça uma proporção, é importante ter presente que a população brasileira soma neste início de milênio em torno de 170 milhões de habitantes, e 70% é constituída por católicos. Mesmo que uma considerável parcela de batizados não seja praticante, pode-se perceber a desproporção entre a quantidade de fiéis e o baixo número de padres. Do total de sacerdotes, cerca de 12 mil são brasileiros e 4 mil estrangeiros. Os religiosos são em torno de 8 mil, entre estrangeiros e brasileiros, e a outra metade é constituída pelo clero diocesano (1).

Quase metade da população brasileira (43%), é afrodescendente(2). Isto soma mais ou menos 73 milhões de pessoas. Portanto, no Brasil está a segunda maior população negra do mundo, superada só pela Nigéria no continente africano. A razão deste expressivo número de negros no país, deve-se ao fato da escravidão. Entre os séculos XVI e XIV foram trazidos das várias regiões da Àfrica para toda a América, em torno de 11 milhões de negros/as transformados em escravos. Deste total, praticamente a metade veio para o Brasil.

Foi também no Brasil que a escravidão durou um tempo maior. Começou em 1532 e só terminou em 1888. Após a abolição da escravidão, fato do qual o Papa Leão XIII participou enviando carta à princesa Izabel pedindo o fim da escravidão, os negros continuaram sendo marginalizados, sem direito às terras e excluídos da sociedade. Ao longo de todo o século XX os negros no Brasil viveram na condição de uma espécie de “apartheid social”.

A grande maioria da população brasileira afrodescendente é católica. Mesmo assim a presença de negros no clero e na Vida Religiosa é bastante recente e numéricamente reduzida. Hoje, quando se comemora 500 anos de evangelização do Brasil, os afrodescendentes chegam próximo a 1000 sacerdotes entre religiosos e diocesanos. Até 30 anos atrás o número de padres negros não chegava a 100. O considerável aumento de padres e vocacões negras nos seminários e nas casas de formação para a Vida Religiosa é um acontecimento recente, é uma realidade pós-conciliar.

As mudanças motivadas pelo Concílio Vaticano II e suas implementações na América Latina, sobretudo através da Assembléia do Espiscopado Latino-Americano em Medellin em 1968, marcou a caminhada decisiva da Igreja em direção ao mundo dos pobres. Muitos bispos tornaram-se conhecidos pela sua evangélica e radical opção para com os pobres. Só para lembrar alguns deles citamos os nomes de Dom Hélder Câmara, Cardeal Paulo Evaristo Arns, Dom Pedro Casaldáliga, Dom José Maria Pires, Dom Tomás Balduíno. Fora do Brasil temos a inesquecível memória de Dom Proaño (Equador), Dom Arceo Mendes e Dom Samuel Ruíz (México), bem como o mártir dos pobres, Dom Oscar Romero ( El Salvador).

Aí teve início a eclesiologia das Comunidades Eclesiais de Base, e também o processo de inserção da Vida Religiosa nos meios populares. Uma prática da Vida Religiosa marcada pelo martírio dos sacerdotes e religiosas: Padre João Bosco, Ezequiel Ramin, Josimo, irmã Adelaíde e outros. A opção da Igreja para com os pobres e a inserção da Vida Religiosa no meio do povo, tiveram como contrapartida um surto de vocações para o clero diocesano e para as congregações religiosas. Neste meio estão também as vocações surgidas das famílias negras.


1 - ORIONITAS E VOCAÇÕES AFRODESCENDENTES

Quando Dom Orione chegou ao Brasil no início da década de 20, padres e freiras negros/as era coisa rara, em todo o Brasil podia-se contar com os dedos das mãos. As congregações religiosas não aceitavam vocações negras e, entre as dioceses, só a de Mariana em Minas Gerais fazia exceção. Em alguns seminários e casas de formação a proibição era explícita. Em outras, a proibição era praticada de forma disfarçada. Qualquer desculpa era suficiente para não aceitar vocações negras.

O destino comum das congregações européias que continuavam chegando abundantemente ao Brasil desde o final do século XIX e, sobretudo no início do século XX, eram as regiões de imigrantes europeus no sul e sudeste do país: Italianos e alemães, sobretudo. Dom Orione não segue esta tradição. Foi instalar-se em Minas Gerais (Mar de Espanha), portanto, uma região marcada fortemente pela população negra, há poucas décadas saída da escravidão. As famílias negras mineiras são muito católicas, até os dias de hoje. Descendem dos povos africanos “Bantu”, espalhados por toda a Àfrica, mas sobretudo em Angola, Moçambique, de onde vieram desde os primeiros momentos da escravidão no século XVI (3). A maioria do clero e religiosos/as afrodescentes no Brasil hoje, são de origem Bantu.

Os Bantus, sobretudo, deram uma nova característica ao catolicismo popular no Brasil e em algumas outras regiões da América Latina também, por exemplo, em Cuba (4). Transformaram as Irmandades e Confrarias portuguesas em organizações religiosas afro-brasileiras. Além do profundo respeito à Eucaristia, embora muitas vêzes fossem impedidos de participar por impedimentos dos patrões e também dos ministros da Igreja, construiram uma sólida tradição de veneração à Virgem Maria, sobretudo sob o título de Nossa Senhora do Rosário, da Boa Morte, de Aparecida.

Aliás, a devoção à Nossa Senhora Aparecida, padroeira nacional do Brasil, está profundamente ligada ao sofrimento e esperança do povo negro. No início do século XVIII quando a escravidão era intensa no norte do Estado de São Paulo, do fundo das àguas do Rio Paraíba, surge nas redes de pescadores a pequenina imagem de Nossa Senhora. Era de cor negra, a mesma cor dos escravos e escravas, e estava partida, quebrada, como a vida do povo cativo. O primeiro milagre de Nossa Senhora Aparecida, foi em benefício do negro escravo Zacarias. Nossa Senhora quebrou-lhe as correntes e o libertou da escravidão. Este sinal foi o bastante para que os negros e negras entendessem em sua tradição de fé que Nossa Senhora Aparecida é a mesma Virgem Maria de Nazaré que continua através dos povos, sobretudo dos mais sofridos, cantando o “Magnificat”.

Certamente no encontro de Dom Orione com Dom Silvério Gomes Pimenta, bispo de Mariana, no início do século XX em Roma, falaram sobre a dura situação e a fé do povo negro. As correspondências que trocaram depois, deram ao beato fundador mais ânimo ainda de vir ao Brasil não só para contribuir com a Igreja nas suas necessidades, como revelava à Madre Michel, mas para minorar a dor desta gente e abrir as portas da Vida Religiosa aos negros como escreveu ao próprio Dom Silvério.

O então bispo de Mariana, conhecido pelo seu zelo pastoral e pela brilhante cultura que o levou à membresia da Academia Brasileira de Letras, era uma presença rara na hierarquia eclesiástica. Filho de mãe negra ( escrava ou alforriada), o jovem Silvério, protegido pelo seu padrinho, o então bispo de Mariana para quem sua genitora trabalhava, chegou ao sacerdócio e, posteriormente ao episcopado. Como a lei da escravidão, baseada no direito romano, prescrevia que “a cria segue o ventre”, Silvério era, portanto negro, e sujeito ao cativeiro.


2 - PE. PATTARELLO: UM TESTEMUNHO QUE SURPREENDEU

Podemos imaginar com que pesar e dor, Dom Silvério falou para Dom Orione sobre as condições da população negra no Brasil e a sua exclusão do clero e da Vida Religiosa. Certamente foi o conhecimento destas realidades que levaram Dom Orione a escrever para Dom Silvério dizendo que viria ao Brasil para acolher os negros/as como religiosos e religiosas. De fato, em 1961 quando na Assembléia Geral da Conferência dos Religiosos do Brasil, discutia-se sobre a possibilidade de receber negros e negras na Vida Religiosa (5), o inesquecível padre Pattarello, provincial orionita presente naquela Assembléia, para espanto dos demais, declarou que tinha oito diàconos negros que no ano seguinte seriam ordenados sacerdotes, além de irmãos e outros sacerdotes afrodescendentes que a Congregação já tinha. Mais tarde, um destes religiosos negros, foi sagrado primeiro bispo diocesano de Tocantinópolis, atualmente bispo de Jataí, Goiás.

A decisão da Assembléia da Conferência dos Religiosos e Religiosas do Brasil sobre a recepção ou não de negros e negras na Vida Religiosa não foi tranquila e muito menos unânime. Alguns provinciais argumentaram que assim como na Bíblia nem todas as tribus foram chamadas para o serviço do altar, também nem todos os povos são vocacionados. Outros disseram ainda que negros eram descendentes de Cam, portanto “raça” maldita, e não de Sem que deu origem à “raça” bendita. Chegou-se a dizer que por procederem de culturas naturalistas, os negros/as não seriam capazes de manter o celibato. Apesar de todos estes absurdos argumentos, concluíram que de qualquer maneira teriam que reformular as orientações de proibição de entrada dos negros/as nos seminários e casas de formação porque a recém aprovada Lei Afonso Arinos, proibia práticas explícitas de racismo e descriminação. A saída encontrada foi: “Aceitam-se vocações negras, porém após cuidadoso e minucioso exame”. Na prática com isto queria-se dizer que se modificava muito pouco.

Algumas congregações masculinas e femininas, com raridade rebiam negros/as, porém com distinções. Os negros eram aceitos como “irmãos”, que naquele contexto significava “serviçais”. As negras igualmente eram aceitas para realizarem os serviços domésticos e liberar as religiosas brancas para o magistério.


3. UMA FAMÍLIA COM MUITAS PROCEDÊNCIAS

Certamente, para alegria do Beato Luís Orione, já na década de 40 quando a congregação começou a deslanchar-se no Brasil, entre as primeiras vocações estão presentes os negros. A primeira religiosa orionita no Brasil, na metade do século, foi uma jovem negra, a irmã Conceição. Eu, por certo, não fui dos primeiros orionitas negros. Antes de mim já havia chegado aqueles que mencionei anteriormente, e antes deles que havia chegado vários outros também, como o Pe. Renato Scano, o Ir. Eugênio, Ir. Affonso.

Entrei para o seminário orionita de Guararapes, na região noroeste do Estado de São Paulo, Brasil, em 1961. Já havia solicitado a entrada em dois seminários, um diocesano e outro religioso. Mesmo tendo todas as condições objetivas para o ingresso, não fui aceito. Aqueles seminários não recebiam negros. Anos mais tarde, tanto a diocese quanto a congregação religiosa que não me receberam, pediriam meus serviços de assessoria teológica. Sempre que posso eu os atendo.

Passado algum tempo, sem que eu procurasse, fui abordado por um desconhecido, um homem branco, com chapéu redondo de caçadores na Àfrica, conjunto safari e óculos redondos à John Lenon, portanto trajes nada comuns para aquela região, o qual me perguntou sobre o meu desejo de ser padre e prometeu encaminhar-me para o seminário. Ele fêz um contacto por telefone com o seminário orionita para que o promotor vocacional viesse à minha casa. O irmão Francisco, religioso afrodescendente orionita que mais tarde se tornaria sacerdote e que era o promotor vocacional, veio visitar e levou-me para o seminário em Guararapes onde éramos verdadeiramente uma família com procedência as mais diversas. Não havia qualquer manifestação de racismo ou descriminação. Os nossos diretores, dois sacerdotes italianos, padres Fulvio Mastrangeli e Dino Barbiero e os demais responsáveis pela formação, nos tratavam todos iguais. Este mesmo procedimento havia nos demais seminários orionitas em Belo Horizonte e Siderópolis em Santa Catarina.

Em 1980 o padre Aloísio Hilário de Pinho, sacerdote orionita afrodescendente, foi sagrado bispo de Tocantinópolis. Tratava-se do primeiro sacerdote orionita brasileiro no episcopado. Hoje Dom Aloísio Hilário é bispo de Jataí em Goiás para onde foi transferido recentemente.


4 - O PAPA E O INCENTIVO ÀS VOCAÇÕES AFRODESCENDENTES

Em suas visitas à América Latina, o Papa João Paulo II tem se dirigido com frequência à população afroamericana denunciando sua situação de desigualdade social, econômica e política. Por ocasião da abertura da Assembléia do Episcopado Latinoamericano em Santo Domingo, em outubro de 1992, em sua mensagem dirigida aos Afroamericanos, o Papa acentuou a necessidade de promover as vocações afrodescendentes em todo o continente (6).

A palavra do Santo Padre fêz éco e cada vez mais são florecentes as vocações de origem afro. Serviu sobretudo para eliminar todo e qualquer reserva que seminários diocesanos e religiosos, bem como casas de formação para religiosas ainda pudessem ter como herança do período pré-conciliar. Hoje, as dioceses todas e as congregações masculinas e femininas têm negros e negras, inclusive no episcopado há cinco bispos negros, entre eles um orionita. Trata-se de um número simbólico se comparado com o grande número de fiéis afrodescendentes e, sobretudo, se comparado com o número de mais de 350 bispos que compõem a Conferência dos Bispos no Brasil. Entretanto, não deixa de ser um marco importante.

Atualmente, o desafio maior não é quanto à acolhida de afrodescendentes no clero diocesano e na Vida Religiosa, mas é sobretudo, como promover uma formação que preserve a identidade, ou seja, como ser religioso e sacerdote sem perder as próprias características culturais. Evidentemente que este grande desafio diz respeito não só aos afrodescendentes, mas também aos indígenas e às vocações que emergem dos meios populares. Contudo, entre os negros/as é ainda mais marcante por tratar-se de um segmento étnico secularmente marginalizado e descriminado. A castração cultural é igualmente uma forma de impedimento e de exclusão.

A inculturação da Vida religiosa como resposta ao apelo da Igreja para que as culturas dos povos sejam respeitadas e ajudem a expressar a fé, é sem dúvida o caminho que pode garantir uma Vida Religiosa autêntica e plural. A Vida Religiosa inculturada exige uma metodologia formativa e vivencial que não é extranha à vida dos povos e suas culturas, visto que inculturar-se significa, antes de tudo, expressar a fé a partir do gênio próprio de cada cultura. Significa também aproximar o ambiente formativo e a própria Vida Religiosa à realidade dos pobres. Este foi o caminho e a pedagogia de Dom Orione e de seus seguidores. Nos seminários vivia-se, e certamente ainda se vive, uma vida simples, de trabalho, estudo e de muita fraternidade. Enfim, uma verdadeira vida de família, onde negros, brancos e todas as demais matizes étnicas, nos sentimos sempre irmãos acolhidos pelo mesmo espírito universal e paterno do nosso Beato fundador.

Veja: Per le vocazioni dei figli d'Africa in Brasile (Antonio Lanza)


NOTAS
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1. Cf. CNBB., -Diretório Litúrgico, Brasília,1999. CRB., -Cadernos de Vida Religiosa. Rio de Janeiro, 1999.
2. Afrobrasileiros é a denominação que se dá aos negros e aos descendentes de negros, mesmo que tenham sofrido miscegenação e tenham a cor da pele clara.
Fonte: IBGE, -Censo demográfico brasileiro de 1990. Rio de Janeiro, 1991.
3. Sobre este tema, conferir a obra de Luiz Felipe de Alencastro: O Trato dos Viventes. Companhia das Letras, São paulo, 2000.
4. Ver Fernando Ortiz, -La Religión Popular em Cuba. Habana, 1936.
5. Relatório da Assembléia Geral da Conferência dos Religiosos do Brasil do Ano de 1961.
6. João Paulo II, -Mensagem aos Afroamericanos. Loyola, São Paulo, 1992.

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