Estudo do P. Flavio Peloso. Um relatório inédito, dirigido ao Santo Ofício, e aqui guardado, revela que o padre padre Gemelli tinha feito uma visita a San Giovanni Rotondo no ano anterior, em 1919, na qual, ao contrário de 1920, pode ver as mãos do futuro santo e entrevistá-lo.
PADRE GEMELLI NÃO MENTIU:
ELE REALMENTE VIU OS ESTIGMAS DO PADRE PIO
Flavio Peloso
Padre Agostino Gemelli foi acusado por muitos biógrafos do Padre Pio de ter mentido, pois no rápido encontro de 1920 não conseguia ver seus estigmas. No entanto, um relatório inédito, dirigido ao Santo Ofício, revela que o padre Gemelli tinha feito uma visita a San Giovanni Rotondo no ano anterior, em 1919, na qual, ao contrário de 1920, pode ver as mãos do futuro santo e entrevistá-lo.
Fonti: Articolo pubblicado no "Avvenire", 28 agosto 2021.
Articolo pubblicado no “Bollettino dell'Archivio per la storia del movimento sociale cattolico in Italia”, LI(2016), p. 71-86.
O padre Agostino Gemelli, franciscano, e o padre Pio de Pietrelcina, franciscano capuchinho, são dois eminentes protagonistas do século XX. Com diferentes dinâmicas de vida, abriram caminhos culturais e ascéticos ainda percorridos por grandes movimentos de pessoas que se inspiram neles e nas suas vivências. No entanto, seu encontro, ocorrido na década de 1920, é considerado “uma página triste” pelos métodos e conteúdo que o caracterizaram. Quando estudei o relacionamento de Dom Luigi Orione com Padre Pio de Pietrelcina (na obra Don Luigi Orione e Padre Pio de Pietrelcina, na década da tempestade: 1923-1933, Jaca Book, 1999) vim a conhecer aquele detalhe delicado da acusação de falsidade contra Padre Agostino Gemelli (que teria julgado os estigmas, alegando tê-los visto, fato sempre desmentido por algumas testemunhas).
É possível que um padre e cientista do valor de Agostino Gemelli tenha descaradamente dito uma falsidade? No entanto, os testemunhos da visita do padre Gemelli ao Padre Pio, em 19 de abril de 1920, documentam unanimemente que houve uma conversa muito breve entre os dois e sem a visão dos estigmas.
Finalmente, num artigo que publiquei no Boletim do Arquivo para a história do movimento social católico na Itália, intitulado “Padre Agostino Gemelli disse a verdade: viu os estigmas do Padre Pio de Pietrelcina”, pude reconstruir a história apoiado em documentos e resolver o enigma. A seguir, vai apenas um resumo do texto.
Gemelli fez uma visita a San Giovanni Rotondo em 18 a 19 de abril de 1920, junto com Armida Barelli. Armida foi recebida pelo Padre Pio no dia 18 de abril e cuidou de preparar o caminho para o encontro com o Padre Gemelli, para que este examinasse os estigmas. No entanto, o exame dos estigmas foi negado e chegou-se a um acordo pelo qual o padre Gemelli se encontraria com o padre Pio na manhã seguinte, na sacristia, brevemente, antes da missa.
E assim aconteceu: o Padre Pio chegou à sacristia, acompanhado pelo Padre Benedetto de San Marco in Lamis e por Emanuele Brunatto. Padre Gemelli e Padre Pio trocaram poucas palavras e nada mais, para grande decepção do estudioso, que havia deixado Milão especialmente para ter aquele encontro e ver os estigmas.
No mesmo dia da visita, o padre Gemelli enviou um relatório ao Santo Ofício no qual afirmava acreditar que as manifestações somáticas eram de natureza histérica. Dizia, também, que eram necessárias investigações mais aprofundadas e precisas. No entanto, ao fazer esse relatório, ele alegou ter submetido o Padre Pio a interrogatório e descreveu as feridas em suas mãos, alegando tê-las visto.
Os presentes à reunião — padre Benedetto e Brunatto — evidentemente negaram que padre Gemelli tivesse podido, em seu brevíssimo e seco encontro com o futuro santo, fazer um interrogatório e mesmo ver suas feridas. E era a pura e óbvia verdade. No entanto, o padre Gemelli continuou afirmando, ao longo de sua vida, que havia visitado e examinado os estigmas do Padre Pio, embora fosse acusado de falsidade.
E aqui está a novidade, que só agora surgiu. Como pode ser visto na correspondência com o Santo Ofício, o padre Agostino Gemelli visitou San Giovanni Rotondo e o padre Pio duas vezes. A primeira vez foi “em 1919, de passagem por Foggia por motivos de serviço militar”, conta ele. “Fui a São Giovanni Rotondo — escreve padre Gemelli — acompanhado pelo secretário do então Bispo de Foggia. Este último expressou o desejo de que eu examinasse Padre Pio e depois lhe relatasse o resultado de minhas observações. Minha viagem poderia ser útil. Achei de meu dever aceitar e decidi ficar dois dias em São Giovanni Rotondo, hóspede do Convento dos Capuchinhos. Tive a oportunidade de ver Padre Pio várias vezes e de conversar longamente com ele. Também examinei as feridas de Padre Pio”. Apresentou-se como médico e, assim, ele continuou “até ao fim a comédia do médico convictamente convertido, para que pudesse ter a oportunidade de observar, ver, averiguar. Tudo isto comuniquei a Mons. Bispo de Foggia”.
Assim escreveu o padre Gemelli no relatório detalhado ao Santo Ofício (13 páginas datilografadas, com correções autografadas), datado de 6 de abril de 1926. Com ele dá a conhecer que, na primeira visita de 1919, não revelou que era o padre Gemelli; e que eles, Padre Pio e os frades, não perceberam nada, devido ao “artifício inocente” e à “comédia” com que encobriu sua identidade.
No entanto, aquela primeira visita sempre foi mantida “escondida” por segredo de ofício, para “cumprir o dever de obedecer aos Superiores”: “Eu me limitei a dizer que tinha visitado o Padre. (…) O Santo Ofício sempre me aconselhou a ficar calado e eu obedeci».
Por isto, os amigos e biógrafos do Padre Pio de Pietrelcina puderam continuar afirmando que Gemelli havia dito falsidade, por não ter visto os estigmas na visita de 19 de abril de 1920; e de fato eles falavam a verdade. Da parte de Padre Gemelli, continuou a afirmar: “Vi os estigmas do Padre Pio”, e isto realmente aconteceu na visita anterior, de 1919. Por sua vez, ele também dizia a verdade.
O padre Gemelli guardou esse segredo embaraçoso durante toda a vida. Depois de 2006, os documentos falam porque são disponibilizados para consulta.